As famílias brasileiras enfrentam um cenário alarmante: 9,86% da renda mensal é consumida apenas com o pagamento de juros, segundo dados do Banco Central referentes a maio de 2025. O percentual é o maior desde o início da série histórica, em 2005, e revela a fragilidade da estrutura de crédito no país.

No total, 27,79% da renda das famílias é usada para quitar dívidas e juros, sendo que mais de um terço desse montante vai diretamente para os encargos financeiros. Para efeito de comparação, nos Estados Unidos esse peso é de 8%, enquanto no Japão não passa de 7,8%.

Por que os juros consomem tanto no Brasil

O diferencial brasileiro em relação a economias desenvolvidas está no perfil do endividamento. Enquanto lá predominam os financiamentos imobiliários, com taxas menores e prazos longos, aqui o destaque são os cartões de crédito e empréstimos pessoais, modalidades conhecidas pelos juros abusivos.

Segundo o Banco Central, apenas 2,13% da renda das famílias está comprometida com crédito imobiliário, enquanto 25,66% está exposta a dívidas de curto prazo e juros elevados.

Juros altos pressionam ainda mais os lares

Em junho de 2025, a taxa média do crédito pessoal chegou a 58,3% ao ano, o maior patamar desde 2023. Ao mesmo tempo, o saldo de crédito com recursos livres aumentou 23,4% em dois anos, evidenciando que mais brasileiros recorrem a empréstimos caros para cobrir despesas do dia a dia.

O resultado é um aumento do risco de inadimplência: o calote superior a 90 dias já atinge 6,3% das operações, segundo o Banco Central.

Juros crescem mais rápido que a renda

Um levantamento da FecomercioSP mostrou que, em 2024, os gastos das famílias com juros avançaram 20,5%, enquanto a massa de renda cresceu apenas 3,2%. Essa diferença amplia a pressão sobre os orçamentos e limita o consumo.

Para o economista Estêvão Kopschitz, do Ipea, o problema não se resolve apenas com educação financeira. Segundo ele, é necessário repensar hábitos de consumo, mas também oferecer linhas de crédito mais justas e menos abusivas.

Superendividamento é o grande desafio

O peso excessivo dos juros no Brasil contrasta com países ricos, onde o crédito imobiliário garante estabilidade no endividamento. Aqui, o uso intenso de modalidades caras cria um ciclo de renda comprometida e crescimento econômico limitado.

O programa Desenrola, lançado em 2023 para renegociação de dívidas, trouxe alívio temporário, mas não resolveu o problema estrutural. A combinação de juros elevados e crédito fácil mantém milhões de famílias aprisionadas em dívidas de curto prazo.

Caminhos para reduzir o impacto

Especialistas defendem que, além de políticas de renegociação, é preciso incentivar modalidades mais sustentáveis, como financiamentos de longo prazo com taxas menores, e ampliar o acesso a produtos de crédito menos onerosos.

Enquanto isso não acontece, o número de brasileiros que destinam quase 10% da renda apenas para pagar juros segue como um retrato claro do custo do dinheiro no país — e um obstáculo para a recuperação financeira das famílias.

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