O Supremo Tribunal Federal tomou uma decisão que pode mudar radicalmente o funcionamento das redes sociais no Brasil: por 8 votos a 3, os ministros decidiram que as plataformas podem ser responsabilizadas por conteúdos publicados por seus usuários, mesmo sem decisão judicial.
A decisão derruba, em parte, o que dizia o artigo 19 do Marco Civil da Internet, que até então blindava as redes de qualquer responsabilidade, a menos que ignorassem uma ordem da Justiça. Agora, o cenário muda: se o conteúdo for ilegal, a plataforma tem o dever de remover assim que for notificada, mesmo que essa notificação não venha de um juiz. Isso vale, por exemplo, para casos de discurso de ódio, fake news, ou outros atos ilícitos.
A única exceção continua sendo para crimes contra a honra, como calúnia ou difamação, nesses casos, ainda é necessária uma decisão judicial para forçar a remoção. No entanto, se o mesmo conteúdo for repetido várias vezes após já ter sido considerado ofensivo pelo Judiciário, a plataforma será obrigada a apagar as novas postagens automaticamente, sem precisar de nova autorização da Justiça.
O ministro Kassio Nunes Marques foi um dos três votos vencidos. Ele defendeu que a responsabilidade deve ser, antes de tudo, de quem publicou o conteúdo, e não das plataformas que o hospedam. Segundo ele, o artigo 19 já oferece equilíbrio entre liberdade de expressão e a necessidade de retirar conteúdos ofensivos, desde que exista uma decisão judicial específica. Mas o entendimento da maioria do STF foi diferente.
Luís Roberto Barroso, atual presidente do STF, afirmou que o artigo 19 “não protege de forma suficiente os direitos fundamentais” e que, por isso, as plataformas precisam assumir mais responsabilidade. O novo entendimento também se baseia no artigo 21 da mesma lei, que já prevê punições para plataformas que não removem conteúdos com cenas de nudez ou sexo, após serem notificadas.
A discussão foi motivada por dois casos emblemáticos: um sobre um perfil falso no Facebook, e outro sobre uma comunidade ofensiva no antigo Orkut. Ambos os casos levantaram dúvidas sobre até onde vai a responsabilidade das empresas de tecnologia no ambiente digital. A decisão do STF terá repercussão geral, ou seja, vai orientar todo o Judiciário brasileiro daqui para frente.
A medida pode ter impacto direto no combate à desinformação e nos limites da liberdade de expressão nas redes. Para os críticos, há o risco de censura prévia, com plataformas retirando conteúdos com medo de punição. Já para os defensores da mudança, essa é uma forma de proteger a sociedade de abusos, como discurso de ódio, ataques a minorias e mentiras com potencial destrutivo.
O Google, uma das empresas diretamente afetadas, já se manifestou e defendeu o modelo original do Marco Civil, com a responsabilização limitada às ordens judiciais. Mas com a decisão do STF, as big techs vão ter que repensar sua atuação no Brasil.
A partir de agora, o jogo muda: as redes precisam agir mais rápido e com mais responsabilidade. O ambiente digital ganha um novo peso legal e quem vive de postar, moderar ou monetizar conteúdo vai precisar se adaptar rápido.