O Brasil bateu um recorde histórico em 2024: quase 8,5 milhões de pessoas decidiram pedir demissão de forma voluntária, segundo o Ministério do Trabalho. Por trás desse número impressionante, o que aparece com força é uma mudança de mentalidade em relação ao trabalho e à qualidade de vida.
A principal queixa de quem largou o emprego é a falta de flexibilidade. Longas horas no trânsito, retorno forçado ao trabalho presencial e dificuldades para equilibrar vida pessoal e profissional têm feito muita gente repensar suas prioridades.
Uma pesquisa que ouviu mais de 53 mil brasileiros revelou que 21,7% dos entrevistados apontaram o deslocamento como o principal motivo para deixar o emprego. Já 15,7% citaram a rigidez nos horários de trabalho, que acaba impactando diretamente a saúde mental e a produtividade.
O psicólogo Filipe Colombini explica que o home office, quando bem administrado, pode ser um grande aliado do bem-estar. Mas ele alerta: trabalhar de casa não é tão simples quanto parece. Segundo ele, é preciso ter organização, planejamento e autoconhecimento para não transformar o benefício em uma fonte ainda maior de estresse.
“Se a pessoa não souber se organizar ou viver em um ambiente doméstico caótico, o estresse pode até aumentar”, afirma Colombini. Ele lembra que o trabalho remoto exige habilidades como gestão de tempo, automonitoramento e foco. Quem não consegue desenvolver essas competências pode acabar se sentindo perdido, improdutivo e ainda mais ansioso.
Além disso, o psicólogo chama atenção para um problema comum: o isolamento social. Segundo ele, muitas pessoas usam o home office como forma de evitar contato com outras pessoas, o que pode enfraquecer ainda mais as habilidades sociais.
“Evitar o convívio reduz ainda mais a habilidade social, que só se desenvolve com exposição. O home office não pode ser uma fuga”, reforça.
O fenômeno das demissões voluntárias em massa também reflete uma transformação mais profunda no que os profissionais valorizam. Após a pandemia, o que antes era visto como luxo, agora virou prioridade: tempo com a família, saúde mental e qualidade de vida.
Para Colombini, o que estamos vendo é uma nova hierarquia de valores no mundo do trabalho. “O bem-estar deixou de ser um luxo e passou a ser uma exigência”, resume o especialista. Segundo ele, quem tem autonomia para escolher o horário de trabalho consegue administrar melhor o tempo com os filhos, as questões pessoais e até a própria saúde emocional.
Essa onda de demissões não parece ser apenas um movimento passageiro. Tudo indica que o mercado de trabalho está passando por uma mudança de mentalidade que veio para ficar.